terça-feira, 23 de junho de 2009

Contra a Indiferença e o Laxismo...


O surreal aconteceu no passado fim de semana...

O antigo atleta paralímpico Carlos Lopes ficou retido em Paris por lhe ter sido vedado o acesso a um avião da TAP com destino a Lisboa, porque o seu cão-guia não possuía açaime.

"Estou retido em Paris com a minha esposa porque um comandante da TAP resolveu que o meu cão-guia não podia entrar no avião sem açaime", relatou, visivelmente indignado, o presidente da Associação de Cegos e Amblíopes de Portugal (ACAPO). Supostamente o referido piloto terá alegado que o regulamento interno da TAP não permitiria que cão-guia realizasse a viagem sem açaime.

Carlos Lopes, que construiu uma carreira cheia de alegrias (quatro medalhas paralímpicas de ouro, oito ceptros mundiais e outros tantos em campeonatos da Europa), garantiu já ter viajado várias vezes de avião, "inclusive na TAP", na companhia da cadela Gucci, que o acompanha há cerca de seis anos, sem nunca lhe ter sido levantado qualquer problema.

"Esta situação é completamente inimaginável. Há muito que viajo com a cadela e nunca tal me aconteceu", disse o também vice-presidente do Comité Paralímpico Português.

O porta-voz da TAP, António Monteiro, lamentou a situação classificando-a como "um excesso de zelo".
Mas excesso de zelo de quem? Do piloto da TAP ou da Administração da TAP?!? Quem aprovou o dito Regulamento Interno?
A verdade é que até domingo passado quando se consultava o web site desta companhia, na página destinada aos "Procedimentos e Assistências Especiais a prestar a Invisuais", estava descrito que o "passageiro invisual deveria ser informado de que o seu cão-guia teria de levar açaime". É óvio que a responsabilidade do sucedido pertence por inteiro a quem aprovou o Regulamento!!!! Parece-me óbvio que o piloto envolvido nesta autêntica "rábula" é o que menos responsabilidades tem em todo o processo. Em última instância limitou-se a cumprir o Regulamento.

Hoje tive o cuidado de consultar de novo o web site da TAP e constatei que a referida página já foi actualizada e neste momento o mesmo regulamento já não faz menção á obrigatoriedade do cão- guia ter de usar açaime. web site da TAP após ter corrigido o regulamento (clique aqui)

No entanto, Carlos Lopes promete tomar medidas quanto ao sucedido, por terem sido violadas leis nacionais e da aviação civil.

Penso que tem todos os motivos para o fazer pois este regulamento da TAP violava de forma grosseira o Decreto-Lei 74/2007, de 27 de Março, onde é consagrado o direito de acesso das pessoas com deficiência acompanhadas de cães de assistência a locais, transportes e estabelecimentos de acesso público - lei dos cães de assistência (cães-guia para cegos e também cães que prestam assistência a surdos e a deficientes motores).

No seu nº 2 define-se que "o cão de assistência quando acompanhado por pessoa com deficiência ou treinador habilitado pode aceder a locais, transportes e estabelecimentos de acesso público, designadamente: Transportes públicos, nomeadamente aeronaves das transportadoras aéreas nacionais, barcos, comboios, autocarros, carros eléctricos, metropolitano e táxis"

O seu nº 3 concretiza não deixando margem para quaisquer tipo de dúvidas: "os cães de assistência são dispensados do uso de açaimo funcional quando circulem na via ou lugar público".

Segundo várias opiniões este procedimento da TAP terá violado igualmente o Decreto-Lei 241/2008, de 17 de Dezembro, uma vez que "a falta de autorização, por parte da transportadora aérea, do seu agente ou do operador turístico, de assistência, quando for solicitada, de um cão auxiliar", constitui contra-ordenação muito grave.

Notícia na RTP (clique aqui)

Deste caso concreto podemos retirar uma conclusão: A TAP não só não cumpria a lei vigente - Decreto-Lei 74/2007, de 27 de Março - como e ainda apresentava um Regulamento Interno onde constavam procedimentos que a violavam se encontrava acima da lei.
A minha vivência mostra-me que este tipo de procedimentos abusivos, que se encontram "fora da lei", são muito habituais no nosso país e são reveladores de uma cultura muito própria que está enraizada na nossa sociedade e que, em última instância, nos remete para uma cultura organizacional que não privilegia a exigência, o rigor, mas antes um certo laxismo e, em certos casos, o autoritarismo. Também não podemos olvidar a parte da formação educacional, na medida que, muitas vezes, existe um desconhecimento total da legislação o que não fomenta o espirito de cidadania e de reclamação sustentada por parte dos utentes dos serviços, levando á passividade e ao imobilismo nos serviços com graves consequências no próprio desenvolvimento do país.

Lembro apenas mais dois exemplos práticos de situações reveladoras desta realidade:

- Quantas vezes nos exigem a entrega de documentos originais ou autenticados, quando uma simples conferência da cópia do documento original, pelo funcionário do serviço, poderia e deveria resolver a situação? Aconselho a leitura do art.º 32.º do Decreto-Lei 135/99, de 22 de Abril, alterado pelo Decreto-Lei 29/2000, de 13 de Março, assim como a orientação técnica n.º .4/DGAP/2004, que são claros sobre a situação.

- Quantas vezes, quando deslocamo-nos a edifícios da administração pública central e local ou de empresas do sector privado, nos obrigam a deixar o Bilhete de Identidade ou o Cartão de Cidadão, na portaria, para podermos aceder aos mesmos? Este comportamento, tem originado algumas situações em que os dados do BI retidos são copiados, sendo depois falsificado o B.I. com esses dados e com uma nova foto. Depois existe a possibiliadde de serem feitos, por exemplo, pedidos de empréstimo que nunca são pagos. Devido a este tipo de situações, o Estado lançou uma circular de aviso que se pode encontrar no link indicado. clique aqui para saber a resposta

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